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Glauber fica, Lira Sai

No artigo, o cineasta, diretor teatral, poeta e escritor, Carlos Pronzato fala sobre a cassação do mandato do deputado Glauber Braga (PSOL/RJ).

“Branco sai, Preto fica” (2015) é um filme de Adirley Queirós, híbrido de documentário e ficção que aborda um episódio acontecido em 1986 em Ceilândia, Região Administrativa do Distrito Federal, próxima a Brasília, quando a PM invade um baile black e parte para cima dos frequentadores com a sua tradicional e deliberada violência, prendendo os pretos e liberando os brancos, num cabal reflexo da democracia racial à brasileira. Se trasladamos este racismo estrutural do país à vida parlamentar, no bojo do binômio Casa Grande e Senzala da nossa sociedade, não será difícil constatar a parcialidade deste novo processo administrativo contra um parlamentar opositor às oligarquias da Casa Legislativa.

 

O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados aprovou na quarta-feira, 9 de abril, por 13 votos a 5, o parecer do deputado Paulo Magalhães (PSD/BA) pela cassação do mandato do deputado Glauber Braga (PSOL/RJ), um aliado das lutas populares, por quebra de decoro parlamentar. A decisão final agora cabe ao Plenário da Casa, em 90 dias.

 

Realizamos dois documentários contra estes ataques à democracia representativa: “Renato, um de nós” (2021) quando da tentativa de cassação do hoje deputado estadual Renato Freitas (PT/PR) e “O alerta do gesto, a cassação de Maria Teresa Capra” (2023) quando esta vereadora do interior de Santa Catarina (PT/SC), hoje com o mandato recuperado, foi vilmente vilipendiada pelos seus colegas da Câmara Municipal, todos homens, por denunciar uma saudação nazista de milhares de bolsonaristas na frente de um quartel, após Lula ganhar as eleições de 2022.  

 

O processo de cassação foi aberto em abril de 2024, a partir de uma ação do Partido Novo que acusa o deputado do PSOL de agredir um integrante do Movimento Brasil Livre (MBL) dentro da Câmara, numa típica cena de provocação da direita, aprendida nas lições da Berlim de 1933, na ascensão do nazismo. “Se tratou de uma reação a um sujeito que por sete vezes foi me atacar, me provocar em espaços públicos onde eu estava fazendo alguma atividade do mandato”, defendeu Glauber Braga em entrevista à Agência Pública na véspera da votação da cassação.

 

Numa clara perseguição política, Glauber também denuncia que o processo é orquestrado pelo então presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP/AL), hoje continuado pelo atual presidente da Casa, Hugo Mota (Republicanos-PB), seu aliado, e foi iniciado em meio às denúncias do Orçamento Secreto, ação que investiga uma manobra do Lira para liberar R$ 4,2 bilhões em emendas. 

Há cinco dias iniciou greve de fome, declarando: “podem chamar como quiserem, eu vou dar manutenção a uma ação de não rendição ao orçamento secreto, a Arthur Lira e companhia”.

 

*Carlos Pronzato é cineasta, diretor teatral, poeta e escritor. Sócio do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB).