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Simone Weil, a filosofia e a vida

No artigo, cineasta, diretor teatral, poeta e escritor Carlos Pronzato analisa a história de escritora francesa de origem judia, Simone Weil.

Há alguns anos li um livro da escritora francesa de origem judia, Simone Weil (1909 - 1943). A condição operária e outros estudos sobre a opressão. Confesso que, além do conteúdo do livro, fundamental para o entendimento do mundo dos criadores da riqueza, os operários, me impactou profundamente alguém que em tão curta existência, abordou com firmeza, independência e total autonomia, temáticas essenciais à vida e à sua época de confrontos ideológicos fundantes, resultando daí reflexões e críticas perturbadoramente corajosas e vigentes nos dias de hoje, tempos da  perniciosa ascensão da ultradireita com sua bilionária maquinaria virtual de fake news, confrontando uma esquerda - institucional - perdida nos labirintos neoliberais da capitulação de todo princípio ideológico na ambição do poder pelo poder.


E a dela não foi uma abordagem tradicional, um mergulho investigativo livresco, acadêmico. Esta filósofa educada agnosticamente, de uma inteligência genial, incorruptível, se entregou de corpo e alma, no sentido literal de ambas palavras na imensidão das suas inquietações existenciais e espirituais, aliando no mesmo acidentado percurso da sua vida, preocupações filosóficas, políticas e religiosas.


Extremamente difícil resumir em poucas linhas o sentido mais puro da liberdade que Simone Weil buscou tenazmente na prática analisando com argúcia radical a exploração, e para isto foi trabalhar como operária numa fábrica entre 1934 e 1935. Na tentativa de verificar seu próprio período pacifista entre 1932 e 1938 (o abandona depois da entrada dos nazistas em Praga em 1939) aborda o exame e o (sem) sentido da guerra, e para isto se alistou nas fileiras anarquistas na Guerra Civil Espanhola e se engajou também na resistência francesa na Segunda Guerra Mundial. Para pensar a revolução foi militar como sindicalista.


Com estas atitudes concretas, entregou o próprio corpo como testemunho de uma experiência radical. Somente assim o conhecimento pode se aproximar da verdade, num contato direto com a vida. “A verdade não é apenas uma obra nascida do pensamento puro (…) Uma verdade é sempre o esplendor da realidade (…) Desejar a verdade é desejar o contato direto com a realidade.” escreve Weil após vivenciar o seu compromisso consigo mesma, a simbiose essencial, braçal e intelectual.


Com apenas 34 anos, em plena guerra mundial, se alimenta pouco, fuma desenfreadamente e é acometida de tuberculose, não admitindo se alimentar além da ração diária dos tickets de racionamento da população e dos soldados nos campos de batalha, o que provoca a sua desnutrição e falecimento. Sua breve vida, de uma intensidade militante espantosa, permanece nos 16 volumes das suas Obras Completas.


* Carlos Pronzato é cineasta, diretor teatral, poeta e escritor. Sócio do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB)